Cultura do excesso: o que o caso de Andressa Urach nos diz

andressa-vestidoAndressa Urach, madrinha de bateria em escola de samba paulistana e detentora de voluptuosas curvas, nem sempre teve este corpanzil que atrai tantos olhares hoje. Parece que durante a sua adolescência sofrera bullying na escola por ser muito franzina. Desfecho já conhecido por todos, a moça resolveu dar a volta por cima; pouco depois dos 20 anos fez sua primeira intervenção estética. Alguns anos mais tarde ganhava a vida e fama pela beldade de seu corpo.

Histórias assim já ouvi com certa frequência: o desorganizado da classe que depois vira o grande administrador; a tímida que se torna palestrante; o avoado que vira o PhD de uma grande universidade; a excluída que se torna uma grande comunicadora. A história de Urach parecia repetir esta capacidade de dar a volta por cima que o ser humano muitas vezes tem: a magricela alvo de deboche que se tornou vice “Miss Bumbum”. Ia bem, ia muito bem, se não fosse por uma questão: o excesso.

Já ouvi dizer que plástica é como tatuagem: não dá pra fazer só uma. Alguém poderia questionar se o excesso de cirurgias plásticas (10, às vezes 20) a que algumas pessoas se submetem poderia ser sinal de algum comportamento patológico. Ou mesmo se a clientela do plástico tem maior incidência de problemas psiquiátricos do que outras populações.

Sobre a segunda questão: um levantamento comparando 232 pacientes de cirurgia plástica com 200 pacientes submetidos a cirurgias de outra ordem mostrou que, ao passo que apenas 4% destes últimos tinham história pregressa de doença psiquiátrica, 19% dos pacientes de cirurgia plástica já tinham apresentado algum problema psiquiátrico na vida. A maior parte dos quadros era de depressão (quase 90%), e talvez a cirurgia plástica entre aí beneficamente para ajudar a autoestima de pessoas que em algum momento de suas vidas estiveram deprimidas e com a autoimagem depreciada.

No que tange a primeira questão, os grandes temores no caso do “paciente compulsivo por cirurgia plástica”, constituindo-se em contraindicações ao procedimento, são os transtornos alimentares (como a anorexia nervosa) e o transtorno dismórfico corporal. Neste último, há uma crença persistente de que uma parte do corpo está alterada, feia. O indivíduo em geral tem uma apresentação normal ou até mesmo atraente, mas persiste a ideia de que aquela parte está de alguma maneira “deformada”. Até 7% das pessoas que procuram o plástico podem ter tal distúrbio. Entretanto o bom cirurgião sabe distinguir o que é uma vontade legítima de uma vontade fruto de patologia.

Mas diante do atual quadro de saúde da modelo culpar o bullying, um possível quadro depressivo, ou outra questão psicológica ou psiquiátrica, é uma grande falácia. Não dá pra fazer diagnóstico por reportagens de jornais e internet… Não dá pra ficar analisando pessoas indiscriminadamente e irresponsavelmente desta maneira.

Mas o que podemos sim alegar é que houve excesso. Vivemos em uma época assim, afinal: o homem que fuma demais, a menina que fica demais na internet, a moça que come demais, o rapaz que bebe demais, a mulher que compra demais, a criança que fica demais no Ipad, a outra que assiste demais televisão, o adolescente que é absorvido pelos games. A moça que queria ficar bonita e foi submetida a um procedimento de preenchimento com 100 vezes a quantidade permitida da substância. O motor cultural da insatisfação, a serviço do consumismo, cada vez mais premente, abrindo buracos no ser humano e estimulando compulsões de toda sorte. Parece que já havia se submetido a no mínimo 5 outros procedimentos prévios: outro possível sinal de excesso? Opinião pessoal do autor: apesar de muita gente gostar, mulheres com essas curvas soam-me como (de novo) exagero e não me atraem. Mas é uma mera asserção pessoal, beleza não se discute.

Imprudência? Imperícia? Procedimento médico feito por não médico? Fruto de problemas psicológicos ou psiquiátricos? Não dá pra saber. Pode ser uma ou mais dessas coisas, pode não ter sido nenhuma. Mas é certo que podemos encarar o fato como desfecho de uma patologia cultural do excesso.

Fica a nossa torcida pela melhora da modelo.